Escrito por Aurelio Fernades, educador, militante dos círculos pela revolução brasileira e no comitê de solidariedade à Revolução Bolivariana no RJ.
Publicado por Luiz Pimenta, militante na comunicação popular do Brasil.
Diretor do Conaicop: Rubén Suaréz
Água, mais um direito de cariocas e fluminenses que escorrem pelo ralo do capital...
Foto Divulgação / Pexels
Sec XXI, janeiro de 2020. Diversos relatos pipocam nas redes sociais descrevendo uma água muitas vezes turva, com cheiro e gosto de terra saindo das torneiras e filtros, distribuída pela CEDAE (Companhia de Águas e Esgotos do Estado do Rio de Janeiro), principalmente das zonas norte e oeste do município do Rio de Janeiro. São numerosos também os relatos de pessoas que passaram mal após a ingestão.
“Água da torneira com cheiro horrível. Dos filtros idem”, conta um internauta.
Trata-se de uma situação inédita para os cariocas que, porém, diversas metrópoles na Europa, na América do Norte, na Austrália, na China, no Japão, já sofreram em determinada etapa do seu desenvolvimento urbano e social: o gosto ruim da água causado pela própria concentração populacional da metrópole.
O problema causou uma corrida por água mineral nas regiões afetadas. Nunca é demais lembrar que o Brasil tem a maior reserva de água doce do mundo e que hoje são motivo de disputa pelas transnacionais.
A causa de tudo isso está relacionada com a multiplicação acentuada de algas e bactérias na água.
Esse aumento leva as algas a produzirem uma substancia orgânica: a geosmina. Essa substancia pode alterar o gosto e o cheiro, mas não explica a turbidez ou aspecto “barrento” relatados em alguns locais. Uma concentração elevada da substância pode interferir na qualidade.
A causa de base do desequilíbrio ecológico e da proliferação das algas em Guandú ocorre pelo fato de que o corpo d’água não consegue absorver e depurar naturalmente a carga poluidora dos esgotos despejados in natura em seus afluentes por quase toda a população da bacia. Visto que as algas azuis têm a sua principal fonte de alimento no fósforo presente nos esgotos sem tratamento, se fazem presentes as condições favoráveis para sua proliferação.
“Houve um aumento de algas e bactérias na água e, embora não relatado pela CEDAE, estes microrganismos podem produzir alguns compostos que podem ser nocivos à saúde quando presentes em grandes quantidades”.
Na lagoa de captação da CEDAE, em Nova Iguaçu, é visível a presença de grande quantidade de plantas aquáticas e esgotos in natura que são transportadas para a lagoa de captação de água da ETA Guandu operada pela CEDAE.
O aumento expressivo de algas não é um fenômeno natural como tem alegado a CEDAE: a presença de grande quantidade de algas e de plantas aquáticas no Sistema Guandu se reproduzem devido à ausência de tratamento dos esgotos sanitários na região.
A operação do Sistema Guandu pela CEDAE, que abastece a Baixada, a Capital e o Vale do Paraíba do Sul, depende quase exclusivamente de um único manancial, o rio Paraíba do Sul, tem a função de garantir diretamente o abastecimento de água de 8,7 milhões de habitantes (ou seja: 75% da população fluminense), e apesar disso, recebe diariamente cerca de 1 bilhão de litros de esgotos sem tratamento. Sua bacia hidrográfica é a mais degradada, desmatada do estado.
Outra ameaça potencial de desastres ambientais na bacia do Paraíba do Sul, é a perigosa presença de mais de 600 barragens de resíduos de mineração e industriais situadas na divisa entre os Estados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, na Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul.
Existem recentes diagnósticos oficiais, ignorados ou omitidos da população pelos governos federal e do estado, assim como pelas agências reguladoras ANA e AGENERSA, que afirmam que a região Sudeste brasileira, em especial os estados de São Paulo e do Rio de Janeiro passam por uma preocupante situação de comprovada “insegurança hídrica” ou “estresse hídrico”.
A ANA (Agência Nacional de Águas), estima que cerca de 60,9 milhões de pessoas que residem na região Sudeste já sofrem riscos de desabastecimento: deste total, 32 milhões de pessoas residem nos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo e estariam vulneráveis ao risco de falta d’água devido a eventos climáticos recorrentes, como estiagens mais severas. Somente no estado do Rio, este risco hídrico ameaça 11,8 milhões, o que representa 68,6% dos 17,1 milhões de habitantes.
A solução que elimina a causa real da “morte” de um manancial é o controle de fontes poluidoras pontuais (indústrias, culturas agrícolas) e o enfrentamento da questão urbana, em última análise, da própria produção do espaço urbano da metrópole que segrega a população mais pobre em direção a áreas cada vez mais periféricas onde encontram um pedaço de terra de custo mais baixo.
Para começar é necessária a retomada dos investimentos em saneamento básico para superar o déficit de 70% da população fluminense que não tem acesso ao tratamento de esgotos.
Mas não basta implantar sistemas de esgotamento sanitário. Os governos tem de urbanizar favelas, criar parques e conceber um modelo de gestão hídrico, intensificando o monitoramento do manancial e da água distribuída e divulgando informações com ampla transparência e veracidade para toda a população. Por outro lado são necessários órgãos de controle de caráter popular e classista na CEDAE para resgatar a confiança e a credibilidade de todos os envolvidos, não apenas da CEDAE e seus funcionários.
Nas situações de crise de qualidade da água – assim como em outras crises – busca-se apontar para um culpado. Não existe um culpado, existe um responsável: a corrida desenfreada por lucro baseada na superexploração que impede a urbanização dos assentamentos precários de interesse social, eliminar fontes poluidoras pontuais, implantar sistemas de afastamento e tratamento de esgotos, criar áreas protegidas e recuperar nascentes e matas ciliares.
São as instituições e entes públicos das esferas municipal e estadual que compactuam com essa busca desenfreada de lucro e a superexploração. Tranquilizam-se com a ausência de políticas de moradia digna para a baixa renda. Incentivam ou fingem não ver os assentamentos precários produtores de votos, não fiscalizam a poluição causadas pelas empresas. Apostam sempre na privatização dos lucros para uma minoria e na socialização do prejuízo para a maioria da sociedade.
Resta às trabalhadoras e trabalhadores da cidade e do campo organizarem essa luta...
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